quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Saudades do Meu Pai!

É, já deu para ter certeza que terei de conviver de forma definitiva com esta coisa de "não ter mais pai"! Já se passou quase um mês, mas é difícil falar de como é isto: a gente convive, vê diariamente a morte passando na tv, famílias sepultando seus entes queridos sequestrados pela violência das guerras,do trânsito, do animalismo humano; mas quando chega na casa da gente, na alma da gente, é diferente (mesmo sabendo, é claro, que não somos nada diferentes uns dos outros!). Aos poucos já não choramos mais, já não vemos a cadeira vazia (ela se confunde com as outras tão iguais), as comidas prediletas, as manias, as implicâncias, o jornal que não fica mais esparramado sobre a mesa, a tosse dos últimos dias... vamos nos acostumando com isto na certeza de que a vida continua e que temos que acompanhar as outras vertentes que nos fazem caminhar! São as "Perdas e Ganhos" que a maturidade vai nos apresentando e das quais a escritora e poeta Lya Luft nos fala tão bem!
Saudades enormes do papai mas também enorme orgulho principalmente do que vivi com ele nos seus últimos dias! Ele me constuiu uma historia que precisei ler até o último capítulo para entender a grandiosidade das lições que podemos aprender! Conversou sobre o câncer desde o dia que descobriu que estava pagando pelos quase 60 anos de fumante. Reclamou um pouco da bobagem que havia feito,mesmo sendo avisado que isto poderia matá-lo, mas falou sem muita culpa, tendo feito o que fez pelo prazer dos viciados e pela dificuldade de mudanças de hábitos! Enfrentou o tratamento com dignidade e sempre disposto a cumprir o caminho traçado pelos médicos consultados; recebeu amigos e solidariedade com emoção, suportou a cansaço do leito e a dificuldade do transporte em cadeira de rodas sempre fazendo um pouco de graça com a situação: nunca o ouvi reclamando de dores ou de revolta contra qualquer coisa! Perdoou rancores imperdoáveis por mim, comeu frutas e tomou os sucos que eram aconselhados como milagrosos, comungou semanalmente como já fazia nos últimos anos! Abraçou e beijou minha mãe sempre com muita felicidade e carinho! Recebia os filhos com um olhar que não sei se vou conseguir esquecer! Procurei acompanhá-lo e sei que fiz muito pouco em relação ao tudo que ele fez por mim! Mas em nenhum momento fiz nada como troca, como pagamento: acho que cada pessoa tem um amor não rasgadamente declarado prá ser vivido! Amei meu pai muito mais do que eu tinha consciência...foi prá mim uma lição de vida e de morte!
Eu estava com minha mãe e minha irmã Leyse no momento em que ele se foi e vi que não houve dor, nem revolta, nem aflição: só mesmo se virou pro canto e dormiu... o sono estava tão profundo que nem elas perceberam! Nem sei se ele viu que morreu! Perdi meu pai que me ensinou muito e que deixou para o final a grande lição de tudo que assisti: viver com dignidade é coisa de vida e morte mesmo!
Não estou nem triste mais, só com saudades mesmo!

Um beijo carinhoso prá minha querida mãe que soube viver um grande amor e que foi o esteio que já eu sabia ser por tudo que passamos!

9 comentários:

Anônimo disse...

Sem comentários!

Anônimo disse...

Ah! Essa saudade.
Ela não sai de dentro de nós.
E não sai porque faz parte de nós
e nos alimenta, e nos dá forças!
O tempo torna essa saudade
uma coisa boa
um elo com os queridos e amados pai,
ou mãe.

Postador disse...

Sem comentários mesmo!
Só aplausos, para uma vida digna...

Carlos José disse...

É de emocionar!
Carlos José

Anônimo disse...

Caro Marcelino,

Havia uma fazenda no meu mundo de menino que hoje habita o meu mundo de adulto. Sua presença está ainda tão impregnada em mim que me faz pensar que o tempo vivido é distinto do tempo sentido. Todos aqueles cheiros, calores, cores e sons já tão distantes e, no entanto, tão presentes. Talvez a vida seja apenas impressão.

É fechar os olhos e deixar-me ir que tudo se faz intensamente presente: vejo um carro de boi, um jeep, uma porteira. Vejo uma festa de casamento na roça e a sanfona dando vida ao baile. Tudo isso sob a luz da lua. Vejo lá uma curva de estrada de terra, ouço aqui o rangido de uma roda do carro de boi. Ao fundo, para além da plantação de mandioca, o carneiro jorra as suas lágrimas para matar a minha sede. “Olha ali uma aranha colorida a tecer suas teias no telhado do estábulo”, digo para mim, e sinto em minhas narinas o cheiro de estrume. E fazenda tinha um gigante.
Para mim, o dono da fazenda era um gigante de pele clara e olhos tão profundamente negros quanto os seus cabelos enrolados. De onde veio aquela brancura era um mistério. A voz quase rouca, a fala muito rápida, mas menos ligeira do que seu raciocínio.
Quanta energia, quanta autoridade a daquele gigante! Eu reparava, sentado sobre a porteira, que até os touros abaixavam as cabeças quando ele passava, ao certo em sinal de reverência. Os seus olhos eram pequenos para o seu corpo, mas viam muito bem. Na certa haviam visto, já naquele tempo, muitas histórias e causos, como se já tivessem visto em outras vidas aquilo que deveras veriam na próxima curva da estrada.

O gigante inspirava respeito, mas era brincalhão. Lembro-me de um causo. Nessas fazendas a noite se povoa de personagens misteriosos. Aos poucos, se você prestar muita atenção, da fumaça da lamparina vão surgindo o sujeito que arrasta correntes, o menino que se esconde nas moitas para roubar pó de café e tantos outros personagens, que não têm sombra mesmo em noite de lua cheia. Pois certa vez, no escuro da noite, o gigante bateu com força na porta da sala da sede da fazenda. Fez isso, ora vejam, só para assustar as crianças que dormiam exaustas depois de um dia pleno de aventuras e travessuras. Disse, ainda posso ouvi-lo, que era a mula sem cabeça. Que medo! Vai ver ele era um desses personagens também.
Da última vez que eu vi o gigante ele já não era tão enérgico assim, já não era tão alto assim ou talvez eu tenha definitivamente crescido. O tempo já havia escrito em sua face as suas sinuosas linhas e o gigante já não despertava do seu grande sono. O gigante era agora um homem em sua mortal humanidade. Mas ainda sim eu estava diante de um grande homem, desses que a gente nunca esquece.

Um abraço,

Beto

Anônimo disse...

Caro Marcelino,

Havia uma fazenda no meu mundo de menino que hoje habita o meu mundo de adulto. Sua presença está ainda tão impregnada em mim que me faz pensar que o tempo vivido é distinto do tempo sentido. Todos aqueles cheiros, calores, cores e sons já tão distantes e, no entanto, tão presentes. Talvez a vida seja apenas impressão.

É fechar os olhos e deixar-me ir que tudo se faz intensamente presente: vejo um carro de boi, um jeep, uma porteira. Vejo uma festa de casamento na roça e a sanfona dando vida ao baile. Tudo isso sob a luz da lua. Vejo lá uma curva de estrada de terra, ouço aqui o rangido de uma roda do carro de boi. Ao fundo, para além da plantação de mandioca, o carneiro jorra as suas lágrimas para matar a minha sede. “Olha ali uma aranha colorida a tecer suas teias no telhado do estábulo”, digo para mim, e sinto em minhas narinas o cheiro de estrume. E fazenda tinha um gigante.
Para mim, o dono da fazenda era um gigante de pele clara e olhos tão profundamente negros quanto os seus cabelos enrolados. De onde veio aquela brancura era um mistério. A voz quase rouca, a fala muito rápida, mas menos ligeira do que seu raciocínio.
Quanta energia, quanta autoridade a daquele gigante! Eu reparava, sentado sobre a porteira, que até os touros abaixavam as cabeças quando ele passava, ao certo em sinal de reverência. Os seus olhos eram pequenos para o seu corpo, mas viam muito bem. Na certa haviam visto, já naquele tempo, muitas histórias e causos, como se já tivessem visto em outras vidas aquilo que deveras veriam na próxima curva da estrada.

O gigante inspirava respeito, mas era brincalhão. Lembro-me de um causo. Nessas fazendas a noite se povoa de personagens misteriosos. Aos poucos, se você prestar muita atenção, da fumaça da lamparina vão surgindo o sujeito que arrasta correntes, o menino que se esconde nas moitas para roubar pó de café e tantos outros personagens, que não têm sombra mesmo em noite de lua cheia. Pois certa vez, no escuro da noite, o gigante bateu com força na porta da sala da sede da fazenda. Fez isso, ora vejam, só para assustar as crianças que dormiam exaustas depois de um dia pleno de aventuras e travessuras. Disse, ainda posso ouvi-lo, que era a mula sem cabeça. Que medo! Vai ver ele era um desses personagens também.
Da última vez que eu vi o gigante ele já não era tão enérgico assim, já não era tão alto assim ou talvez eu tenha definitivamente crescido. O tempo já havia escrito em sua face as suas sinuosas linhas e o gigante já não despertava do seu grande sono. O gigante era agora um homem em sua mortal humanidade. Mas ainda sim eu estava diante de um grande homem, desses que a gente nunca esquece.

Um abraço,

Beto

Anônimo disse...
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Glória Vargas disse...

Glória Vargas

Acolhendo as emoções de meus diletos amigos,hoje tirei a manhã e,o dia, para compartilhar de um sentimento inenarrável ; o da partida,mais precisamente o da perda.
Aqui vasculhando as entranhas da net , deparei-me com uma crônica de meu amigo MARCELINO PADILHA, no seu blog;um tributo ao PAI que partira....nosso inesquecível JOSÈ CARLOS PADILHA.
.Nessa hora, o sentimento se traduz de forma idêntica , nas mais infindáveis vezes na vida de cada pessoa!
amigo, aqui deixei uma parte de meu pranto para consola-lo por esse teu momento o meu abraço terá sempre um lugar que transporta toda essa nossa saudade de seu amado pai nosso grande amigo.

Ayres Koerig disse...

Por intermédio da minha amiga Denyse, sua irmã, cheguei a esta página da net escrita por você. Belas crônicas principalmente a que leva por título: SAUDADES DO MEU PAI (assim morrem os santos).
Siga em frente Marcelino...
Escutamos sua voz!
Bota pra fora menino,
Conta o que sabe pra nód!